Pesquisas nacionais e internacionais apontam que a desnutrição atinge até 60% dos internos, aumentando a demora na recuperação e os riscos de mortalidade
(Foto/Capa: Banco de Imagens/Pinterest)
O Hospital Regional de Piracicaba (HRP-Unicamp) inaugurou, nesta segunda-feira (15/04), o Serviço de Nutrologia ampliando assim o quadro para 25 especialidades médicas e sete não médicas oferecidas a uma população estimada em 1,5 milhão de moradores de 26 cidades que compõem a região de Piracicaba. A especialidade visa reverter o cenário atual perverso, no qual, segundo pesquisas nacionais e internacionais, até 60% dos pacientes que se submetem a procedimentos cirúrgicos apresentam estado de desnutrição no Brasil e na América do Sul, índice que eleva significativamente os riscos de evolução para o óbito. Além do incontestável ganho à Saúde do paciente, os benefícios também contemplam as finanças dos hospitais, já que a cada um dólar investido na Terapia Nutricional há uma economia de 52 dólares nos gastos das instituições.
A desnutrição intra-hospitalar é um problema de saúde pública e está ligada ao aumento significativo de morbidade e mortalidade, segundo pesquisas científicas publicadas pela plataforma SciELO (Cientific Electronic Library Online). Segundo a biblioteca virtual, a desnutrição é um dos problemas que afetam a América Latina e cerca de 50% da população hospitalizada já é admitida com algum grau de desnutrição. O problema afeta tanto pacientes atendidos nas redes públicas como nas particulares. Estudos realizados em países como os Estados Unidos, Suécia, Holanda, demonstraram que a desnutrição hospitalar não é exclusiva dos países em desenvolvimento, encontrando-se também nesses países prevalência entre 30 a 50%.
O Inquérito Brasileiro de Avaliação Nutricional (Ibranutri) avaliou, em 2020, quatro mil pacientes e demonstrou que aproximadamente 48% da população hospitalizada eram desnutridos. Desses, 12,6% apresentavam desnutrição grave, sendo maior com o aumento da permanência hospitalar e nos pacientes com cânceres.
Ainda de acordo com os nutrólogos, a desnutrição pode afetar adversamente a evolução clínica dos pacientes por aumentar o tempo de permanência hospitalar, a incidência de complicações pós-operatórias, como infecções e retardo na cicatrização de feridas, além de aumentar a taxa de mortalidade.
O nutrólogo trabalha com a identificação precocemente desse grupo de pacientes em risco nutricional, para que possa ser elaborado uma Terapia Nutricional adequada tanto no pré, como no pós-operatório, com o objetivo de minimizar esses danos colaterais citados anteriormente. “Além disso, há evidências que para cada dólar gasto em Terapia Nutricional há uma economia de 52 dólares nos gastos hospitalares. Ou seja, todo mundo acaba ganhando, tanto o paciente, como o próprio hospital”, contabiliza a médica.
“Atualmente existem várias dados na literatura mostrando que os pacientes cirúrgicos desnutridos são aqueles que apresentam maior mortalidade pós-operatória, morbidade, tempo de internação, taxas de readmissão e custos hospitalares. Acredita-se que entre 25% e 65% dos pacientes submetidos à cirurgia já estão em risco nutricional. Esse número é maior entre os pacientes que irão realizar alguma cirurgia de grande porte do trato gastrointestinal ou cirurgia oncológica”, afirmou a médica nutróloga, Stefanie Miori, responsável pelo Serviço de Nutrologia do HRP-Unicamp, especialista também em Clínica Médica.
Apesar de ter sido reconhecida oficialmente pelo Conselho Federal de Medicina em 1978, a Nutrologia ainda surge como uma novidade na rede hospitalar, principalmente pública, no Interior do Estado de São Paulo. De acordo com o estudo de Demografia Médica no Brasil, realizado pela Universidade de São Paulo (USP) no ano de 2020, apenas 1.771 nutrólogos eram registrados nos Conselhos Regionais de Medicina (CRM). NO Estado de São Paulo é onde encontramos a maior concentração desses profissionais.
“O HRP-Unicamp trabalha para oferecer aos pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) as mais diversas especialidades médicas e não médicas objetivando contemplar toda a complexidade que envolve o cuidado de pessoas. O Serviço de Nutrologia na instituição vem ao encontro dessa realidade perversa, que aponta a subnutrição e desnutrição de pacientes, o que aumenta os riscos nas intervenções cirúrgicas”, afirmou o superintendente do HRP-Unicamp, médico infectologista Vitor Marim.
“A nossa gestão está otimista quanto aos rumos que o HRP-Unicamp vem tomando para garantir uma gama de serviços de qualidade e com profissionais de ponta, como esses novos médicos nutrólogos que vem somar ao nosso Corpo Clínico”, avaliou o superintendente do HRP-Unicamp, Vitor Marim.
Para o médico nutrólogo Klevin Canuto, que também compõe a equipe do Serviço de Nutrologia do hospital, a partir de terapias nutricionais como a oral, enteral ou até parenteral, quando o sistema digestivo não funciona, o paciente terá mais chances de uma plena recuperação após as cirurgias. “São vários os benefícios para os pacientes que recebem terapia nutricional adequada. Há uma redução na incidência de mortalidade, morbidade, taxas de infecções, tempo em ventilação mecânica. Também há melhora no processo de cicatrização de feridas e menor incidência do aparecimento de lesões por pressão. Além de minimizar o declínio do status funcional do paciente após a alta”, aponta Canuto.
Escopo de atuação
A Nutrologia é uma especialidade médica que se dedica ao estudo dos nutrientes e sua relação com a saúde e a doença. Ela abrange o diagnóstico, prevenção e tratamento dos distúrbios metabólicos e nutricionais, bem como a promoção de qualidade de vida. O trabalho dos nutrólogos, de acordo com a Associação Brasileira de Nutrologia (Abran), visa realizar uma avaliação global do paciente, não se limitando apenas à alimentação. Além das orientações nutricionais, os médicos nutrólogos adotam uma abordagem médica, nutricional e comportamental para tratar seus pacientes.
O nutrólogo tem atuação tanto no ambiente hospitalar quanto ambulatorial, sendo o médico responsável por diagnosticar, prevenir e tratar doenças relacionadas à nutrição. A formação acadêmica resulta na principal diferença entre nutrólogo e nutricionista, já que o nutrólogo tem graduação em medicina, com especialização em Nutrologia.
Segundo a Abran, o nutricionista é profissional qualificado para prescrever dietas, criar um planejamento e ajudar na reeducação alimentar do paciente. Já o nutrólogo trabalha com o diagnóstico, prevenção e tratamento de doenças nutrológicas, que podem envolver desde situações de carências nutricionais (anemia, falta de vitaminas e minerais), doenças nutroneurometabólicas (como obesidade, diabetes, hipertensão) e distúrbios alimentares (bulimia, anorexia, compulsão alimentar).
“O nutrólogo exerce papel importante dentro da Equipe Multidisciplinar de Terapia Nutricional, auxiliando na triagem de pacientes com risco nutricional, e participando da elaboração de uma terapia nutricional otimizada, podendo ser baseada em suplementos nutricionais orais, nutrição enteral ou parenteral”, finalizou Stefanie.
